É seguro conduzir depois de sofrer um enfarte do miocárdio?

António Ferreira

10 de Junho de 2013

Até que ponto o enfarte do miocárdio é um problema para a segurança rodoviária? Sabemos que o enfarte do miocárdio é, juntamente com outras condições médicas cardiovasculares, uma consequência do estilo de vida atual é uma das doenças que mais contribuem para os níveis de mortalidade que nos rodeiam. Como tal, este é um problema que causa grande impacto.

No contexto da circulação rodoviária, o enfarte pode ser causa de acidentes de trânsito que, a priori são considerados inexplicáveis. Mas qual serão as implicações que o enfarte no miocárdio poderá ter para que o sofreu, durante o ato de condução? Essa condição médica poderá resultar na perda de capacidades necessárias para a condução de veículos? Será possível conduzir após o enfarte?

Uma das situações mais controversas relativamente ao enfarte cardíaco está relacionado com o fato de já ter acontecido e o sujeito afetado, que para além de paciente é também condutor, deve voltar à sua vida “normal”, depois de passar pelo sucedido. Felizmente, cada vez mais pessoas sobrevivem a um enfarte cardíaco, em parte porque as estratégias de reestruturação de uma artéria coronária obstruída que, no fundo, é a raiz da patologia.

Também cada vez mais surgem dilemas no que diz respeito à inclusão da pessoa nas atividades da vida normal: atividades profissionais, passando por relações de todos os tipos, até uma atividade que envolve enorme respeito social: a condução de veículos. No momento da alta médica, seja de cuidados primários ou hospitalares, são poucas as pessoas que fazem estas perguntas ao médico: “Quando voltarei a trabalhar? Quando poderei conduzir de novo?

Enfarte do miocárdio e condução

Critérios para avaliar o regresso à condução

Estas são as preocupações clássicas de uma pessoa que esteve afastada da sua vida normal e quer voltar à normalidade o mais breve possível. Obviamente, não nos estamos a fazer de médicos, já que cada pessoa é diferente e este tipo de questões devem ser resolvidas em consulta médica, mas podemos destacar os parâmetros que orientam os profissionais médicos, ao estimar quando uma pessoa que sofreu um enfarto pode voltar a fazer o que é considerado de “vida normal”.

Durante anos, as diretrizes utilizadas por médicos são coletadas e tabulados pelas sociedades europeias e norte-americanas de Cardiologia, e basicamente obedecem a estes três parâmetros:

1. O grau de incapacidade gerado pela falha mecânica de um coração afetado pelo enfarte. Isto é, a falha da “bomba” que expele a corrente sanguínea, também definido como insuficiência cardíaca derivada. Dependendo do grau de deficiência, a pessoa afectada perderá facilmente o fôlego, só por fazer um pequeno caminho no parque de estacionamento. Felizmente, este problema é geralmente raro, mas ainda poderá ser restritivo para o ato da condução.

2. As complicações resultantes de falha eléctrica de um coração danificado, ou seja, possíveis arritmias que poderão ocorrer, mesmo tendo que exista o bom funcionamento do coração. Uma arritmia em uma situação de trânsito pode representar um sério risco para a segurança rodoviária da pessoa e qualquer outro utente da estrada, que esteja nas suas imediações.

3. E como tantas outras doenças, o do ato de condução é influenciado por fármacos e dispositivos que ajudam o paciente a se reintegrar no seu dia-a-dia, seja temporariamente ou permanentemente. Existem medicamentos que interferem com a segurança rodoviária, tais como betabloqueadores e dispositivos que são implantados sob a pele, destinados a produzir automaticamente choques elétricos e a funcionar como um pequeno desfibrilhador, para restabelecer o ritmo cardíaco.

Logicamente e dependendo do caso, o médico irá considerar as muitas variáveis ??que envolvem a pessoa afetada pelo enfarte, pelo que cada paciente terá uma situação clínica ou um prognósticodiferente. Normalmente, (salvo exceções), cada atividade realizada na vida anterior ao enfarte será recuperada de forma sequencial: primeiro uma coisa e depois outra.

A condução não será uma exceção.

Enfarte do miocárdio e condução

Reavaliações médicas do condutor após um enfarte do miocárdio

Geralmente, em caso de enfarte do miocárdio sem complicações, a Sociedade Americana do Coração estima em três meses o tempo mínimo de recuperação, antes de se poder voltar a conduzir um carro. Por sua vez, a Sociedade Europeia de Cardiologia tem prazo fixado em um mês. No caso dos motoristas profissionais, os americanos aconselham três meses de espera antes de reavaliar a situação,enquanto que na Europa a espera deverá ser de seis semanas, o que inclui um teste de esforço normal sem fármacos, seguido poir um eletrocardiograma.

Alguns organismos são mais conservadores do que os outros, com certeza, mas ambos se orientam pelo mesmo motivo: a alta incidência de eventos, tais como uma recaída de enfarte ou arritmias, que ocorrem após o período de recuperação. Portanto, é um fator que deve ser acompanhado de perto, antes de proceder novamente à condução.

Após o período de monitorização e desde que a pessoa esteja livre de sintomas incapacitantes, deve demorar menos tempo para que o condutor obtenha um relatório favorável por parte de um especialista, para lhe reconhecer a capacidade de conduzir, desde que não existam factores que o poderão prejudicar e restringir de conduzir para sempre.

Vejamos um exemplo: Quando o doente é equipado com um desfibrilador automático isso implica uma série de reavaliações, cuja frequência pode se prolongar por até 6 meses. É nas reavaliações que é analisado o bom funcionamento do dispositivo e do número de descargas que produz. Este gadget evita que o motorista tenha essas arritmias, que poderiam ser muito perigosas para a condução, no entanto, mesmo com as descargas do dispositivo, a pessoa pode perder a consciência temporariamente. Isto significa que, mesmo que ela esteja protegida pelo desfibrilador, é possível perder a carta de condução por sofrer de “muitas” descargas, sejam elas apropriadas ou não.

Existe uma “via” para além do enfarto do miocárdio? Será possível voltar a conduzir depois de sofrer um enfarte? Certamente que sim, com os devidos cuidados, bem como controlos apropriados e aconselhados pelo médico, como acontece com muitas outras condições médicas.

Assessoria | Dr. Josep Serra
Foto | Heikenwaelder HugoAndrew MaloneParker Michael Knight