Com a entrada, no passado mês de Junho, do sistema da carta de condução por pontos, surgiu a questão da reabilitação dos condutores infratores, ou seja, quem transgredir e acumular a perda de um determinado números de pontos, terá de frequentar ações de formação capazes de fazer recuperar esse número de pontos perdidos, ainda que de uma forma progressiva.
Mas a questão que hoje me faz redigir algumas linhas e considerações, não se prende com o número de pontos perdidos ou o que leva à perda desses pontos, mas sim à forma como é realizada essa reabilitação e de que forma é ou não vantajosa essa mesma reabilitação e a forma como é efetuada.
Uma pequena consideração formativa
Já, por diversas vezes, aqui desenvolvi neste espaço considerações pessoais, sobre a problemática dos comportamentos de risco ao nível rodoviário. Hoje, faço-o novamente, no sentido dos leitores perceberem o cerne da questão – uma vez que quem tem a responsabilidade de o fazer, continua a assobiar para o lado. O erro comportamental está na formação de base.
É do senso comum, como alguns gostam de dizer, que todos sabem que o problema está na formação; no entanto a melhor formação que um ser humano pode ter, é a da representação, ou seja, a do exemplo.
E tal como assim é na vida, tal também deverá ser na condução; se houver um bom exemplo por parte dos tutores às crianças, elas interiorizarão mais fácilmente comportamentos que não são de riscos, desenvolvendo-os no seu dia-.a-dia. Ou seja, se um condutor, que transporta crianças, tiver uma boa postura rodoviária, no respeito pelos outros e no cumprimento das regras, a possibilidade daquela(s) criança degenerar será menor.
A reabilitação e as suas vantagens
Antes de me alargar na escrita sobre a reabilitação, prefiro começar pelo fim da questão; a vantagem. Haverá alguma vantagem na reabilitação de um condutor infrator? Pensar que sim é exatamente a mesma utopia de quando se interna um indivíduo toxicodependente numa clínica e se acredita que ele vai ficar totalmente recuperado. Espera-se que a pessoa deixe a droga, no entanto não se combate, na verdade, a base do problema. Na reabilitação para infratores de condução a situação é exatamente a mesma coisa.
Como se pode tentar reabilitar um condutor que não teve uma educação rodoviária de respeito pelo cumprimento de regras ou pelos outros intervenientes do meio rodoviário, com 12 horas de formação distribuídas por dois dias de sábado? Não pode! Jamais será possível. Ou seja, está montado um excelente negócio que, um dia, mais tarde, certamente, irá servir uma investigação da policia judiciária, com contornos impressionantes.
A reabilitação instituída na lei portuguesa
Um condutor que atinja o valor de 4 pontos na sua carta de condução fica sujeito à participação em ação de formação; ou seja, quem acumular uma quantidade de pontos por transgressão, até que atinja o número 4 de pontos em carta, terá de se inscrever, num prazo de 15 dias, numa ação de formação de 15 horas e dessa forma iniciar um processo de recuperação de pontos.
Inscreve-se, frequenta e sai no final de dois sábados e dois almoços de convívio, ciente que cumpriu o seu dever de frequência em ação de formação. Parece que tudo está bem, pois cumpriu a legislação em vigor. Se até ao dia 31 de Maio de 2016 a ocorrência de uma contra-ordenação grave ou muito grave davam direito a inibição de conduzir, agora com o sistema de pontos o condutor pode optar por, inscrevendo-se e frequentando uma ação de formação, continuar a conduzir.
A título de exemplo; se até ao final de Maio o condutor fosse apanhado numa operação “STOP” com uma taxa de álcool de 0, 90 g/l de álcool, incorria numa contra-ordenação muito grave, sujeita a coima e a inibição minima de conduzir de 2 meses. Hoje, está sujeito à coima (multa), mas pode optar por, ao invés de entregar a sua carta e cumprir os dois meses de inibição, inscrever-se numa ação de formação de reabilitação e continuar a conduzir.
As ações de formação são realizadas em sala, abordam os temas que deram causa à perda dos pontos e já está. A questão é simples: deixará o individuo de consumir produtos estupefacientes se durante 15 horas, dentro de uma sala, o(s) formador(s) lhe apresentar imagens e filmes de acidentes de indivíduos que iam sob o efeito dessas substancias? A resposta é simples; claro que não!
E aquele condutor que perdeu os seus pontos por ter sido apanhado, algumas vezes em excesso de velocidade no seu carro topo de gama. Será que após 15 horas de formação ele vai deixar de conduzir com excesso de velocidade como o fazia anteriormente e passará a respeitar os limites impostos?
E porque é que é assim? Pela simples razão que as formações não vão funcionar, uma vez que a educação rodoviária de base, enquanto crianças, não esteve presente. E não será com 15 horas de formação que ela vai passar a estar presente.
O que se pode fazer para melhorar os comportamentos dos condutores?
O que se pode fazer para melhorar o comportamento dos condutores? Esse é o grande desafio, mas que os responsáveis legislativos não querem evoluir. Ou seja, como atuar no sentido de levar a que a formação básica que não foi dada atempadamente, possa agora tentar ocupar algum do seu espaço? A resposta está na revalidação.
A introdução da alteração às datas de revalidação dos títulos de condução, foi algo positivo e rejubilador. No entanto, falhou num ponto crucial onde poderia ter atuado; a revalidação ser acompanhada com horas de formação teórica e horas de formação prática, assim como sanções de valor pecuniário mais baixo, mas com introdução de horas de serviço comunitário…para todos, sem exceção ou impunidades politicas.