A tecnologia afeta mais do que nunca a segurança rodoviária. Os carros integram cada vez mais sistemas e prestações para “nos tornar a vida mais fácil”. Muitos fabricantes apostam em afirmar que os seus novos veículos reduzem a carga mental da condução. Isto é algo que pode ser muito benéfico, mas se houver uma série de condicionantes.
Apesar de todas as tecnologias que já estão integradas na condução atual, o fator humano continua a ser a chave e o guia da prevenção em termos de segurança. De acordo com a Fundação MAPFRE, no que toca ao fator humano:
(…) se algo for evitável, incorremos em responsabilidade caso não nos utilizemos os meios preventivos para o fazer.
Enquanto não se alcancem os últimos dois níveis de condução autónoma (e falta bastante tempo até que tal aconteça), não poderemos retirar ao fator humano a relevância que tem. Juntamente com isto estão todos aqueles sistemas que facilitam a condução.
Descarga e carga mental da condução
A combinação de tantas tecnologias resulta em situações complexas. Enquanto que os últimos sistemas ADAS reduzem de forma incrível a sinistralidade e a acidentalidade, outros ameaçam produzir o efeito contrário.
Conforto, comodidade e infoentretenimento são os valores que os fabricantes de automóveis utilizam para promover os seus veículos. A mistura de todos estes conceitos tem alguma margem de perigo para a condução. Falamos dos casos nos quais a redução da carga mental da condução implica um relaxamento excessivo, ou permite diminuir o bom hábito da atenção permanente.
De que precisa o nosso cérebro para conduzir sem riscos?
O conforto dos veículos de última geração é útil quando serve para fomentar aquilo a que se chama de atenção dividida. Trata-se da capacidade do nosso cérebro de poder realizar várias tarefas ao mesmo tempo. Isto porque durante a condução, o cérebro está ativo em diferentes planos: sensorial, emocional, motor e cognitivo.
Ainda que tenhamos muito interiorizado o ato de conduzir, interferir nesses processos mentais pode trazer consigo situações perigosas. É o que acontece quando desviamos a atenção ao volante por culpa, por exemplo, de mudarmos o foco da nossa atenção da estrada para o telemóvel.
Podemos encontrar exemplos tecnológicos que, longe de fomentar a segurança na condução, ainda a atacam de forma direta. Por isso dizemos que conduzimos às cegas. O mesmo acontece com os ecrãs cada vez maiores dos carros, com inúmeras funções. Fazia ideia que cada dois segundos dedicados a um dispositivo eletrónico significa que conduz às cegas por 660 metros e perde 40% do ambiente de estrada?
Alerta por excesso de conforto
Existem mais estudos que falam sobre a incidência negativa dos sistemas de infoentretenimento. No que toca ao âmbito do «excesso de relaxamento», há ainda bastante incerteza. O fator humano, quanto a cansaço, fadiga e/ou sonolência, continua a protagonizar esta acumulação de riscos.
Ao mesmo tempo, os avanços no campo do conforto estão na ordem do dia. Sistemas avançados de amortecimento avançados para não sentir os buracos da estrada ou a melhoria do som a bordo e do isolamento acústico levam, em certa medida, a um afastamento do ambiente onde conduzimos.
Parece o início de uma nova época na qual condutor e veículo começam a tornar-se independentes um do outro. Os níveis intermédios de condução autónoma acabaram, em poucos anos, por confirmar a tendência. Os seus enormes benefícios para a segurança rodoviária estão em debate. Isto não quer dizer que, ao mesmo tempo, existam certos riscos de que não se fala tanto.
Os efeitos da automatização sobre o cérebro humano
O debate que aí vem está relacionado com os efeitos psicológicos da automatização. Passando para os veículos, já há uns anos que a NASA falava sobre isto. Stephen Caser, psicólogo investigador da NASA, a propósito do piloto automático do fabricante de carros elétricos Tesla, afirma que:
Estar sentado e observar um sistema que funciona perfeitamente é extenuante. De facto, é extremamente difícil para os humanos monitorizar de forma precisa um processo repetitivo durante grandes períodos de tempo. Isto é o que se chama «manutenção da vigilância» (…)
A experiência destes investigadores já tem décadas. Por isso, a aplicação das novas tecnologias deveria ter em conta a própria conceção e desenho dos veículos da próxima década. O diretor geral de tráfego em Espanha, Pere Navarro, fazia referência a esta questão numa entrevista recente:
Talvez se tivéssemos partido da base, ao desenhar o sistema, de que por vezes o condutor tem pressa, bebe e se distrai, pudéssemos ter poupado muito sofrimento (…) Tradicionalmente dizemos que para conduzir precisamos das duas mãos no volante e de toda a atenção. E a verdade é que agora entramos nos carros e temos uns ecrãs gigantes onde gerimos todo o interior e grande parte dos elementos do veículo, um fator de distração. Contradições… são muitas.
É um debate que a indústria automóvel deve manter aberto e que pode ser a chave para que o «Objetivo Zero tenha êxito».
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Fonte: CirculaSeguro.com