A cada ano, cerca de 27 milhões de automóveis em todo o mundo vão para a sucata.
De acordo com a DGT, só em Espanha foram abatidos 879.446 ligeiros em 2019. Trata-se de uma enorme quantidade de resíduos (estimados em mais de 25 milhões de toneladas por ano) que há muito nos teria «enterrado» se não fosse a reciclagem de veículos. De facto, o carro é o produto de consumo mais reciclado do mundo, tendo, assim um papel fundamental na sustentabilidade global.
Uma indústria no auge
Este artigo dá-nos alguns números (como os de cima) que nos ajudam a entender a magnitude da indústria da reciclagem, mal chamada de «indústria da sucata». Um setor composto em 75% por pequenas empresas, o que pressupõe ser um grande dinamizador para as economias locais
O maior exemplo é o do aço e ferro, que constituem 65% do peso total do veículo. As empresas de reciclagem contribuem com 37% da matéria-prima total para a indústria siderúrgica, mais de 14 milhões de toneladas por ano de material proveniente de carros abatidos.
Estima-se que haja uma poupança de 74% da energia destinada à produção do metal e aproximadamente 85 milhões de barris de petróleo.
Claro, os metais ferrosos não são os únicos resíduos que se recuperam de um automóvel na sucata. Já sabemos que os pneus são utilizados para uma série de novas vidas, desde o fabrico de sandálias, até à produção de asfalto. O vidro do para-brisas e janelas destina-se à produção de bancadas, telhas e até bijuteria e joias. O alumínio (que pode chegar a supor 50% do valor dos resíduos) volta para a produção de outros carros. E até as baterias de chumbo, que contém substâncias potencialmente tóxicas, podem ser recicladas em 99%.
Como se recicla um automóvel
A reciclagem de um automóvel não é simples, pois como sabemos é composta por muitos elementos e materiais distintos. Por isso é feito um processo complexo que trata de aproveitar ao máximo os materiais recicláveis de forma a ser o mais sustentável possível. Estima-se que entre 80 a 90% do carro seja reciclado e reincorporado na economia, ficando o resto que não é aproveitável nos aterros.
Inspeção do veículo: O carro na sucata é inspecionado e revisto para determinar se pode ser reparado ou se deve ser abatido definitivamente.
Desmontagem de peças: Retiram-se os elementos de valor que o veículo ainda tem: desde retrovisores até peças do motor ou componentes eletrónicos. Estes elementos são vendidos diretamente em segunda mão ou podem servir para reparar outros componentes.
Drenagem de líquidos: São também drenados e eliminados os diferentes gases e líquidos que serviram para o funcionamento do carro: óleos, lubrificantes, anti-congelantes. Alguns filtram-se e são reutilizados, como o óleo ou o gás, enquanto que os mais periogosos são eliminados de forma segura.
Separação de materiais: Uma vez que o resto do carro fica na sucata, reitram-se os diferentes materiais para a reciclagem: vidro, plásticos, fibras… quando só fica o material da carroçaria e o chassis, tritura-se e comprime-se tudo em tiras ou cubos de metal para a sua posterior reciclagem em fornos de aço.
Legislação de reciclagem de veículos
Apesar de o negócio da reciclagem de veículos já ter demonstrado ser de grande valor económico e para o meio ambiente, as instituições de todo o mundo tiveram de regulá-lo para assegurar que o processo decorre com as máximas garantias de sustentabilidade. Em Portugal regemo-nos pela normativa da União Europeia, que aprovou em 2000 a sua primeira diretiva (conhecida como diretiva ELV ou End-of-Life Vehicles) sobre o impacto ambiental dos veículos em final de vida. A dita diretiva entrou em vigor em 2002.
Ainda que a normativa tenha sido atualizada em 2017, com novas obrigações para os Centros Autorizados de Tratamento de Veículos a partir de 2021, demonstrou ser insuficiente em alguns casos. Em 2018, a Comissão Europeia publicou o seu estudo de avaliação da diretiva, na qual se demonstrava que a cada na desaparecem 3 a 4 milhões de veículos na EU, sem que se conheça o seu paradeiro.
Outros países, como os Estados Unidos, em vez de legislar, quis impulsionar com subsídios a reciclagem de automóveis. Para tal fomentou-se o abate de veículos mais antigos, com ajudas para a compra de novos. Os mais críticos denunciaram que o impacto ambiental gerado pela produção desses novos veículos não compensa a poupança que pressupõe a reciclagem dos retirados.
Setor e sociedade implicados na reciclagem de veículos
Ainda que tenhamos visto que a reciclagem de automóveis é fundamental para a sustentabilidade da indústria a longo prazo, os especialistas asseguram que se trata de uma única fase da Economia Circular a que UE aspira. Este ciclo, numa primeira fase, começa pela eco-conceção do veículo, e continua com outras tantas que acabam por implicar todos os atores do setor e da indústria automóvel.
Por exemplo, os fabricantes assumem a sua responsabilidade ao juntarem-se ao processo. De acordo com a MAPFRE, muitos destes fabricantes esforçam-se por desenhar modelos que contem não só com materiais reciclados de anteriores veículos, mas que também possam ser reciclados com maior facilidade no final da sua vida útil. Este eco-desenho também abarca aspetos como reduzir o peso para diminuir o consumo de combustível, utilizar materiais biodegradáveis ou, utilizar sistemas de propulsão não contaminantes.
Seguindo o ciclo de vida do automóvel, a responsabilidade também nos chegaria a nós. Como proprietários e condutores, estamos obrigados a fazer um uso eficiente e responsável dos nossos veículos. Isto implica um comportamento mais seguro ao volante, uma manutenção adequada que aumente a vida útil, ou uma postura adequada no momento de retirar definitivamente o carro.
Como vemos, a reciclagem dos veículos é apenas um elo na cadeia. Mas um muito importante, sem o qual a cadeia estaria insustentavelmente quebrada. O setor da reciclagem deverá enfrentar novos desafios e oportunidades, derivados da evolução que o próprio setor da automoção vive. O crescimento das vendas online de peças de substituição, a robotização das fábricas, ou a reutilização das baterias do carro elétrico são apenas alguns exemplos.
Fonte: CirculaSeguro.com
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