Longe vão os anos em que as viagens dos motoristas de automóveis pesados de mercadorias rolavam por essas estradas da Europa, muitas vezes mais de 15/20 horas seguidas. Sim, é verdade que já abordamos esta temática, no entanto não com o mesmo desenvolvimento ou ponto de vista de igualdade entre condutores de automóveis pesados.
Preocupados com a segurança dos motoristas de automóveis pesados, as suas condições de trabalho e porque muitos acidentes eram causados pela fadiga acumulada ao longo das horas de condução, resultante de uma normativa da União Europeia, foi transporta para a Lei portuguesa a regulamentação que determina os tempos de condução e repouso dos motoristas de automóveis pesados.
Introdução de legislação laboral no sector
Ainda que sejam muitos os profissionais do volante e suas entidades patronais que discordam do Dec-Lei nº 126/ 2009 de 27 de Maio, a verdade é que ele já proporcionou grandes resultados no sector do tráfego de automóveis pesados. Nomeadamente na diminuição de acidentes rodoviários envolvendo este tipo de viaturas, diminuição dos acidentes de trabalho envolvendo estes colaboradores, diminuição de gastos de consumíveis extra por esforço extra das viaturas, aumento da produtividade, eficiência e motivação dos trabalhadores.
Longe de ser perfeito, até porque apresenta algumas lacunas, este decreto lei dos tempos de condução e repouso é, de todo, incongruente e discriminatório. verifiquemos um caso prático; o senhor João é motorista de uma empresa de transporte internacional de mercadorias. Segundo a lei vigente, o senhor João pode efetuar por semana 56 horas de condução, 4 dias 9 horas e dois dias 10 horas.
No final de uma semana de trabalho o senhor João deverá efetuar um repouso ininterrupto de 45 horas, podendo reduzi-las para um minimo de 25 horas. No entanto, não efetuando essa pausa de 45 horas, terá de as recuperar no tempo que difere entre as horas repousadas e as 45 horas obrigatórias, ao longo das três semanas seguintes.
Uma atividade de voluntariado
Este é um repouso merecido e capacitante de recuperação de energias. Acontece que o senhor João é bombeiro voluntário e, na corporação, conduz veículos pesados de combate a incêndios. Ao chegar da sua viagem, o senhor João foi chamado para ocorrer a um incêndio florestal e lá permaneceu mais de 30 horas. Pode fazê-lo, pois a lei não prevê a instalação de tacógrafos nas viaturas de bombeiros, logo não existe controlo e a Autoridade para as condições de Trabalho não vão à frente de incêndio verificar as condições de trabalho.
Grande parte daqueles operacionais são voluntários e não assalariados. Ou seja, o senhor João não só não fez o seu repouso, como agravou o seu estado de fadiga. No entanto, para efeitos legais de controlo, o senhor João passou um fim de semana no sofá a descansar e a recuperar energias para mais uma jornada semanal de trabalho.
Quando regressar à estrada na segunda-feira, se houver um acidente rodoviário provocado pelo senhor João, esse deveu-se a todo o erro imaginário, mas nunca por motivos de cansaço. A lei dos tempos de condução e repouso é bem vinda, no entanto não pode ser discriminatória ao ponto de ignorar a fadiga extrema a que os bombeiros motoristas estão sujeitos na sua atividade voluntária.
É que neste caso não há restrições aos bombeiros, pois necessita o Estado português destes operacionais a qualquer custo. No entanto, para terem formação externa e modular, nomeadamente a formação de condução em emergência, 75% desses operacionais bombeiros terão de estar desempregados e inscritos no IEFP. Se tal não for, então o Estado Português não assume os custos da formação. Os mesmos elementos uma vez são filhos, outra vez enteados.
Foto ¦José Filipe