Cinco mitos sobre trânsito e segurança rodoviária que vamos desmistificar

Miguel Alves

28 December, 2020

De vez em quando aparecem em conversas informais, e em certos fóruns, falsos slogans e mitos sobre fluidez do trânsito ou segurança rodoviária. Informações que não são verdadeiras, mas parecem, e que podem agrupar-se na categoria dos mitos e do “disseram-me que…”.

Justifica-se ultrapassar os limites de velocidade estabelecidos há décadas porque agora os automóveis estão mais seguro? É verdade que aumentar a velocidade reduz o tráfego? As estradas em linha reta não têm risco? Neste artigo, abordamos alguns desses boatos mais frequentes.

Mito 1
O meu veículo é mais seguro e poderia circular mais depressa”

Muitas vezes ouvimos a afirmação que alega que, como os carros de hoje são muito mais seguros do que os de há décadas, algo que é absolutamente verdadeiro e se deve principalmente ao uso de tecnologia de assistência ao condutor, os limites de velocidade atuais não deveriam ser válidos para veículos novos.

No entanto, quem argumenta isso e acena com este mito, esquece-se de que a segurança não depende apenas dos veículos; a segurança está também relacionada com a infraestrutura e com o condutor e do modo como todos estes elementos interajem entre si.

A isto acrescenta-se outro fator importante, sendo o elemento mais incerto, o condutor que é quem apresenta maior probabilidade de erro. ABS, ESP, BAS ou EBV são dispositivos automatizados para incrementarem a segurança. Mas o condutor pode ter um dia mau, conduzir distraídou ou até ter ingerido álcool.

Aliás, foi esse tipo de argumentação que levou a que uma marca como a Volvo tenha decidido que os seus modelos novos passam a estar limitados a 180 km/h. Simplesmente, porque acima de um determinado nível, nem o automóvel mais seguro dá condições para que a integridade de um ser humano seja preservada.

E quanto maior a velocidade, maior o risco de morrer.

Outro elemento: quanto mais depressa, maior é o consumo de combustível, logo mais emissões se emitem. Mais velocidade é contraditório com os esforços de redução do aquecimento global.

Mito 2
“Se aumentar a velocidade haveria menos tráfego”

É concebível que a velocidade máxima entre dois pontos determine quanto tempo levará, no máximo, a ir de um ponto a outro. No entanto, o tempo máximo de viagem ou a velocidade máxima são apenas alguns dos fatores que influenciam o fluxo do tráfego, que é um fenómeno complexo.

O “trânsito” indica a fluidez com que os veículos circulam numa estrada. Se houver poucos veículos, o trânsito é fluido e os automóveis podem atingir a velocidade máxima da estrada sem obstáculos para uma segurança específica. Mas se existir muito trânsito, os veículos não terão distância segura para acelerar e, se o fizerem, terão que diminuir a velocidade.

Na verdade, um dos motivos pelos quais os congestionamentos-fantasmas surgem sem que se gerem mudanças na estrutura da via, como falta de pistas ou rotundas - é justamente a aceleração e a travagem. É a mudança brusca de velocidade combinada com a falta de distância de segurança, e não a velocidade em si, que gera esse tipo de engarrafamento.

O vídeo que partilhamos em baixo já é antigo, mas é válido para desmontar este tipo de mitos, referindo-se a uma experiência que mostra isso mesmo e que se se aumentar a velocidade não se diminui o trânsito.

De facto, quanto maior for a amplitude de velocidades a que se pode circular numa via [½ vmax; vmax] mais provável é que haja engarrafamentos devido a paragens-fantasma.

Mito 3
“Se existissem mais vias, chegaríamos mais depressa”

Também relacionado com o fluxo de tráfego, outro dos mitos que muitas vezes ouvimos era o dse que deveria alargar-se o númerio de vias na faixa de rodagem para que haja menos trânsito. Novamente, o ponto de partida parece consistente: se numa estrada com duas vias circulam 30 carros por minuto (15 por via) e uma terceira via é adicionada, agora irão rolar cerca de 10 automóveis por via. Certo?

Na verdade, sim, mas apenas por um tempo relativamente curto em comparação com o tempo de vida da infraestrutura. Durante os meses seguintes à abertura da nova via haverá um pouco menos de trânsito. No entanto, em breve, isso começará a alterar-se e o número de veículos começará a aumentar. Trata-se de um paradoxo que é conhecido como posição de Lewis-Mogridge (1990) e é uma aplicação do paradoxo de Braess (1968).

Este enunciado afirma que “à medida que mais estradas são construídas, aumenta também o tráfego que as utiliza” e, assim, o aumento da velocidade média máxima será apenas temporário. Adicionar uma nova via faz com que num primeiro momento se demore menos tempo para circular por essa estrada, contudo, em breve ela será usada e logo se alcançará um novo fluxo semelhante ao nível anterior.

Menos de um ano após a abertura dessa faixa, o trânsito será o mesmo, como evidenciado pelas estradas dos EUA que davam acesso a cidades como Atlanta, Houston, Phoenix ou Denver.

Mito 4
“Se aumentasse a velocidade, ficaríamos menos distraídos”

Há quem acredita que um baixo nível de velocidade está associado a um aumento das distrações. Esta ideia tem por base a convicção de que a rolar a um ritmo mais brando, as pessoas tendem a apreciar mais a paisagem e a distrair-se. No entanto, tal como noutros mitos, isto não é verdade, pois as distrações estão mais relacionadas a fatores pessoais do que com as condições das estradas. Algumas das causas mais comuns de distrações são, de acordo com os especialistas:

  • altos níveis de stress;
  • observar um acidente;
  • olhar para um telemóvel;
  • usar o telefone (mesmo em alta voz);
  • fumar e guiar em simultâneo;
  • mexer em diferentes comandos do automóvel;
  • fadiga;
  • e sono.

Também acresce a esta lista se o condutor está envolto noutros penbsamentos que não os da condução propriamente dita, como, por exemplo, pensar na família, trabalho, dinheiro, problemas económicos ou de saúde. Sabendo disso, pode haver uma relação entre distrações e velocidade? A verdade é que pode, mas não tão frequentemente como os aspetos que enumerámios acima.

Mito 5
Em estradas em linha reta poderia andar-se mais depressa”

Também existe a crença de que as retas da estrada são mais seguras do que as curvas, porque o que se segue é mais previsível, algo que, portanto, deveria permitir acelerar a velocidades maiores do que as marcadas. A verdade é que não. Na verdade, acontece que as linhas retas são particularmente perigosas por causa da monotonia e da confiança que suscitam nos condutores.

Uma das premissas da construção de estradas é a de que não haja muitas seções de retas ao longo de muitos quilómetros. O motivo? Sem curvas, a probabilidade de nos distrairmos é maior.

Em síntese, quando alguém lhe apresentar uma afirmação baseada nalguns destes mitos que apontámos neste artigo, pode contrapor com a argumentação que aqui referimos.

A informação rodoviária é também a chave para combater comportamentos imprudentes, baseados em pseudo verdades.

Imagens | iStock/Zinkevych, iStock/mastersky

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